Ernesto do Canto Faria e Maia
Faleceu a 5 de Abril de 1981 na Clínica do Bom Jesus em Ponta Delgada, aos 90 anos de idade, Ernesto do Canto Faria e Maia, o mais internacional escultor português da primeira metade do século XX.
Nasceu a 15 de Maio de 1890 na freguesia de São Pedro, em Ponta Delgada, no seio de uma ilustre família que, desde o início do século XIX, se distinguira pelos seus serviços à pátria e à liberdade. A sua origem familiar facultou, portanto, o apoio financeiro e o ambiente culto e estimulante que lhe permitiu desde cedo seguir uma carreira totalmente voltada para as artes. Em 1907, termina os seus estudos no Liceu de Ponta Delgada e, no ano seguinte, matricula-se na Escola de Belas Artes de Lisboa onde, após aí concluir o Curso Geral de Desenho em 1911, entra no curso de Arquitetura, que abandona antes de terminar o primeiro ano. Durante este período de estudos em Lisboa, realiza uma série de pequenas esculturas, marcadas pelo estilismo Art Déco, que assina sob o nome de “Ernesto do Canto”.
Inicia o seu trabalho com pequenas esculturas satíricas aquando da sua participação, em 1912, na 1ª Exposição dos Humoristas Portugueses, considerada uma das primeiras manifestações da renovação modernista em Portugal, ao lado de artistas como Cristiano Cruz, Jorge Barradas e Almada Negreiros. Nesse mesmo ano parte para Paris, onde é aluno de Antonin Mercié na École de beaux-arts e de Antoine Bourdelle na Académie de la Grande Chaumière. Em 1913 participa no Salão de Humoristas, no Palais de Glace em Paris, organizado pelo jornal “Le rire” e na 2ª Exposição de Humoristas Portugueses, em Lisboa, com obras de um vincado realismo neorromântico. Interessado em estagiar com o escultor simbolista James Vibert, parte para Genebra no ano seguinte, onde frequenta a Escola de Belas Artes e é introduzido à art nouveau. De volta a Lisboa, participa na 11ª Exposição da Sociedade Nacional de Belas Artes (SNBA) e é atribuído com uma Menção honrosa na Secção de Escultura.
Com o eclodir da I Guerra Mundial, o escultor regressa a São Miguel. Em 1915 participa na 12ª Exposição da SNBA com a obra “Tristeza” e no ano seguinte com a grande estátua “Desespero da dúvida”, onde obtém a medalha de 2ª Classe da SNBA, ex-áqueo com o escultor Maximiliano Alves. Ainda em 1916, parte para Madrid onde trabalha durante um ano no atelier do escultor castelhano Julio Antonio Rodríguez Hernandez e herda o gosto por figuras-tipo da maternidade, inocência e sensualidade. Regressa a Ponta Delgada em 1917, onde executa um conjunto de baixos-relevos para o Coliseu Micaelense e no ano seguinte para o Palácio Jácome Correia. Em 1919 segue para Lisboa, onde apresenta a sua primeira exposição individual no Salão Bobone. Em 1920, volta a São Miguel após a morte da sua mãe e, no final desse ano, instala-se em Boulogne-sur-Seine, Paris, onde reside até 1938. Durante este período participa em numerosos salões em Paris, recebe, em 1925, uma medalha de ouro pela decoração dos estúdios Pomone e um diploma de honra pelas estátuas Pomona e Flora nos jardins do pavilhão da cidade e, em 1926, integra a Exposição de Arte Francesa e Contemporânea de Tóquio e Osaka.
O regresso a Portugal é marcado pelas encomendas oficiais em 1937 para o Pavilhão de Portugal na Exposição Internacional das Artes e das Técnicas da Vida Moderna em Paris, onde recebe um grand-prix da escultura, e em 1940 para a Exposição do Mundo Português em Lisboa. Para estas exposições realizou retratos de grandes figuras da História de Portugal, como Infante D. Henrique, Afonso de Albuquerque e o grupo escultórico D. Manuel I com Vasco da Gama e Pedro Álvares Cabral. A 4 de Março de 1941 é condecorado, durante a presidência de António Óscar Carmona, com o grau de Oficial da Ordem Militar de Santiago da Espada. Em 1943 é reconhecido publicamente com uma exposição retrospetiva organizada pelo Secretariado de Propaganda Nacional e, no ano seguinte, recebe o Prémio de Escultura Manuel Pereira.
Terminada a II Guerra Mundial, em 1946 Canto da Maia regressa a Paris. Em 1948 apresenta na Exposição dos Trabalhos Públicos realizada no Instituto Superior Técnico as estátuas de Gonçalves Zarco, Gil Eanes, Nuno Tristão e João Vaz Corte Real, encomendadas pelo Ministério do Ultramar. Em 1953, volta definitivamente para os Açores e integra a representação de Portugal na 2.ª Bienal de Arte Moderna de São Paulo. Em 1954 realiza a estátua em bronze de Gonçalo Vaz Botelho para o município de Vila Franca, que ainda hoje se mantêm erguida. Em 1966 é eleito vogal honorário da Academia Nacional de Belas Artes. Nos anos seguintes projeta alguns monumentos públicos e participa em diversas exposições, das quais se destacam a exposição “Arte Portuguesa do Naturalismo aos nossos dias”, durante 1967 e 1968, em Bruxelas, Paris e Madrid e a exposição retrospetiva, em 1976, no Museu Carlos Machado, em Ponta Delgada, que lhe reserva em 1979 uma sala de exposição permanente. Entre as diversas obras do escultor destacam-se: “Hino de Amor”, “Êxtase”, “Rapariga com Pombas”, “Náufrago” e “Filho Morto”.
Hoje em dia, Canto da Maia ainda está representado em diversas coleções públicas e particulares, com destaque para a Galerie nationale du Jeu de Paume, em Paris, o Museu do Chiado em Lisboa, o Museu da Guarda e para o Palácio de Santana, em Ponta Delgada. Foi lhe também dedicado em Ponta Delgada a Escola Básica Integrada Canto da Maia e, bem como na freguesia de Campolide em Lisboa, a toponímia de uma das suas ruas.
Ernesto do canto evidencia-se, portanto, como uma figura da primeira geração de artistas modernistas portugueses, tendo participado com êxito na vida artística que “encontrou no gosto por Artes Decorativas um modo […] de ser moderno”.
O funeral realizou-se durante a tarde do dia 6 de Abril, após missa de corpo presente na Capela da Clínica do Bom Jesus de onde seguiu para o jazigo de família no cemitério de São Joaquim.